sexta-feira, 24 de dezembro de 2010

Passam pássaros e aviões
E no chão os caminhões
Passa o tempo, as estações
Passam andorinhas e verões...

domingo, 12 de dezembro de 2010

“Posso não saber nada do coração das gentes, mas tenho a impressão, de que, de tudo, o pior é quando entra a segunda parte da letra de “Atrás da porta”, ali no quando “dei pra maldizer o nosso lar pra sujar teu nome, te humilhar”. Chico Buarque é ótimo pra essas coisas. Billie Holiday é ótimo pra essas coisas. E Drummond quando ensina que “o amor, caro colega, esse não consola nunca de núncaras”. Aí você saca que toda música, toda letra, todo poema, todo filme, toda peça, todo papo, todo romance, tudo e todos o tempo todo, antes, agora e depois, falam disso. Que o que você sente é único & indivisível e é exatamente igual à dor coletiva, da Rocinha a Biarritz. O coro de anjos de Antunes Filho levanta no ar, em triunfo, os corpos mortos de Romeu e Julieta enquanto os Beatles pedem um Litlle help from my friends, e a platéia ainda aplaude e pede bis (o Gonzaguinha também é ótimo pra essas coisas). Meus amigos, abandonados para que eu pudesse mergulhar, voltaram a mil. Tem seus prazeres o fim do amor. Se é patologia, invenção cristã-judaico-ocidental-capitalista, ou maya, ego, se é babaquice, piração, se mudou-através-dos-tempos, puro sexo, carência, medo da morte: não interessa. Tenho certeza que estive lá, naquele terreno. Ele existe.(…) O que quero dizer é justamente o que estou dizendo. Não estou com pena de mim. Ta tudo bem. Tenho tomado banho, cortado as unhas, escovado os dentes, bebido leite. Meu coração continua batendo - taquicárdico, como sempre. Dá licença, Bob Dylan: it’s all right man, I’m just bleeding. Ta limpo. Sem ironias. Sem engano. Amanhã, depois, acontece de novo, não fecho nada, não fechamos nada, continuamos vivos e atrás da felicidade, a próxima vez vai ser ainda quem sabe mais celestial que desta, mais infernal também, pode ser, deixa pintar. Se tiver aprendido lições (amor é pedagógico?), até aproveito e não faço tanta besteira. Mas acho que amor não é cursinho pré-vestibular. Ninguém encontra seu nome no listão dos aprovados. A gente só fica assim. Parado olhando a medida do Bonfim no pulso esquerdo, lado do coração e pensando, pois é, vejam só, não me valeu."

terça-feira, 7 de dezembro de 2010

Brincadeiras

Aos dos outros não, mas seus erros eu perdôo. E brinco te chamando da pessoa mais humana que conheço. Brinco com o que sinto me calando o coração para soltar outro riso bobo de quem não quer briga. Nem saber muito, para evitar dor demais. É assim: você vive tropeçando, mas eu é que caio e me arrebento.
Hoje você vem, sei de cor porque conto os dias. É o sábado da minha semana, mesmo sendo só terça-feira. Você liga avisando, pega o ônibus pelas duas, vai chegar por volta das três e eu ansiosa. Mamãe vai preparar algum bolo pra gente comer, mas só te espero chegar pra descer e ficarmos a sós no portão olhando o mundo que passa, rindo, beijando, beijando muito. Guardo todos os meus pra você, porque minha boca só se completa na sua.
Din-don. Parece que você aperta meu coração junto com aquele botão. Desço, sempre nervosa. Giro a chave e meu estômago já todo virado. Ninguém. Alarme falso? Alguma criança, aposto que foi o Serginho, escondido ali. O susto é tão grande que perco as forças nos seus braços quando te vejo no esconderijo da criança. Você é assim, brincalhão. Brinca até com o que não se deve. Mas me faz feliz.

- Saudade.
- Simm! Muita saudade!
Minhas mãos molhando as suas enquanto conto minhas histórias, você sempre calado. Às vezes penso que não presta atenção. É muito romântico também. Diz as coisas mais lindas e engraçadas. Quando são umas cinco a gente entra e fica atrás do portão sem subir a escada, agora escondidos do mundo.
Nem me dei conta e você colocou a minha mão lá. Agora engasgo de tanto que bate o peito. Bate e você massageia. Ergue-me pelas coxas e fico apoiada entre a parede e o seu corpo tão jovem quanto o meu. A única coisa que você me pede quando liga avisando que vem é que eu vista uma saia. Faço que não entendi mas adoro o pedido. Fico louca que para desfilar todas as minhas fantasias no seu bloco, mas agora estou tão nervosa... A minha primeira vez e também a sua. Vamos chegar lá.
- Natália!
Se eu não cuspi meu coração agora, jamais cuspirei. Quando você já estava quase me penetrando toda apertada-molhada-epa!-, meu pai chama.
Você fica puto, entro em desespero. Será que ele viu? Vai lá. Os dois tensos. Subo, desço, ele no banho queria saber como eu havia acabado com o xampu. Derramou.Que nem a nossa cara.
Você me diz que é hora de voltar, ainda não passam das oito. Liga quando chegar?
Escolhi minha música favorita como toque pra quando você chamar: “Lanterna dos afogados”. Espero acordada pelas notas que não saem do telefone -nem da cabeça- à noite.


Matheus, 07/12/10

segunda-feira, 29 de novembro de 2010

A hora do cansaço

As coisas que amamos,
as pessoas que amamos
são eternas até certo ponto.
Duram o infinito variável
no limite de nosso poder
de respirar a eternidade.

Pensá-las é pensar que não acabam nunca,
dar-lhes moldura de granito.
De outra matéria se tornam, absoluta,
numa outra (maior) realidade.

Começam a esmaecer quando nos cansamos,
e todos nos cansamos, por um ou outro itinerário,
de aspirar a resina do eterno.
Já não pretendemos que sejam imperecíveis.
Restituímos cada ser e coisa à condição precária,
rebaixamos o amor ao estado de utilidade.

Do sonho de eterno fica esse gozo acre
na boca ou na mente, sei lá, talvez no ar.

Carlos Drummond de Andrade

sexta-feira, 26 de novembro de 2010

sexta-feira, 19 de novembro de 2010

Opus

"Posso resumir minha vida atual em uma música" que desafina nas suas cordas, ou nos seus dedos, por entre os quais meu tempo escorre dissonante. Efêmeras notas que tiro diariamente para a canção. As batidas vêm profundas, de uma bateria incontinente em ritmo indefectível, mas que acelera e descompassa no desafino - refrão. É isso. Todas as estrofes procuram seu refrão, assim como meus caminhos buscam você. Encontram, passam por, para depois voltarem, necessitados.
Nada mais meu que essas estrofes soltas. E nada tão significativo como sua parte na canção. Aquela da qual a gente logo lembra quando canta depois - "essa música não sai da cabeça" - e a quase gritamos em exaltação. Os demais pedaços são sombra, metade, coadjuvantes que só os ouvidos mais assíduos conhecem.
Se o tal resumo de vida atual acabar bem, não será numa estrofe solta, mas no refrão repetido, repetido, repetido, abaixando o volume primeiro sem perceber, depois percebemos, nos preparamos para o fim cantando. Abaixando, baixinho, até nos deixar vasculhando por uma última nota no ar. Esperando aquele verso de novo por favor, só uma vez mais. E, mesmo sem que o dueto desafinado de cordas frouxas tenha dado tão certo, ficamos cantarolando sem música no escritório, no ponto de ônibus, no chuveiro. Mas a próxima faixa quer começar a tocar.


Com muita preguiça,
Matheus Alvares - 05/11/10

terça-feira, 9 de novembro de 2010

"O MEC lanche feliz

é ótimo, sensacional.
vem sempre com uma surpresinha".

RVS

domingo, 7 de novembro de 2010

Banho maria

O meio tempo
não vemos

Faz a folha amarelar:
no caderno com a carta não enviada
no livro deixado pro dia seguinte

faz o dente amarelado,
contaminado pelo sorriso
insentido

o meio tempo te exige atitude
exige, não: pede
melhor: sugere
apenas considera
cabe nossa sensibilidade à esse cara:
ele não insiste.
mas também não deixa impune, esvai
com o beijo não dado,
o soco não levado,
a palavra não dita,
a vida não vivida.
belo clichê.

O importante é não viver a banho maria.

Matheus, 07/11/10

quinta-feira, 4 de novembro de 2010

Trecho

Não quero viver ofegado por mergulhos superficiais amiúdes. Em prazeres fugazes de montanhas russas. Prefiro profundidade, chegar onde não dá pé, arriscar imergir no abismo ou me sufocar até me achar morto do que for feito esse mar aqui dentro, lá fora. Para daí, depois da última gota - a que transbordar o balde ou a que secar o oceano -, descobrir que não se morre de intensidade, mas pela falta dela.
Então respirar, porque ter sossego faz um bem...

Matheus, 04/11/10

quarta-feira, 3 de novembro de 2010

Olha a voz que me resta
Olha a veia que salta
Olha a gota que falta
Pro desfecho da festa
Por favor...

sábado, 30 de outubro de 2010

Viagem minha

(...)
haverá ainda os domingos
haverão?
há verão vindo aí
o que tem a ver?
uma coisa com a outra

Matheus, 30/10/10

quinta-feira, 28 de outubro de 2010

Partir est mourir un peu

Quando estás longe, continuas presente em mim. É uma presença que reveste as formas mais diversas: imagens incontáveis, passagens de livros, significações, coisas familiares, marcas na terra; mas o conjunto de tudo isso fica difuso pela realidade da tua ausência. É como se o teu ser se transformasse em lugar, os contornos do teu corpo em horizontes. Vivo portanto em ti como se vivesse num país. Tu existes em todo lado. Nesse país, contudo, nunca te poderei encontrar face a face.
Partir est mourir un peu. Era muito novo quando ouvi esta frase pela primeira vez e logo percebi que ela exprimia uma verdade que eu já sentia. Recordo-a agora, porque a experiência de viver em ti como num país onde é impossível encontrarmo-nos face a face parece-se com a experiência de viver com a recordação dos mortos. O que eu não sabia quando era novo é que nada elimina o passado: o passado vai crescendo gradualmente à nossa volta como placenta da morte.
No país que tu és, conheço os teus gestos, as entoações da tua voz, a forma de todas as partes do teu corpo. Fisicamente, não és menos real, mas és sem dúvida menos livre.
John Berger

sábado, 23 de outubro de 2010

O problema do Rio é que...











... esqueci.

Não fazem ideia do trabalho que me deu escolher as fotos.

domingo, 17 de outubro de 2010

Primaveril

É que a hemorragia - palavra forte essa, que teimo em usar -, meu criado, não tem hora pra acontecer. E é nisso que dá ter um coração sempre aberto: hemorragias - insisto - constantes. estrondosas, desmedidas, apocalípticas. e você nem sabe como posso ser ainda mais violento, se necessário: nunca deixo os sentimentos atrasarem; o problema todo é seu aí com essas palavras, que vivem chegando tarde.

Não me fecho porque, como você sabe, pra tanta lambada que já tomei, levar mais uma ou outra não deve fazer diferença. Além de que, e se eu estiver certo dessa vez? fechando-me, nunca saberemos. E a nossa escolha foi consensual. Fico esperando vocês se acertarem aí. Se ela ainda não quer saber de entrar, os floreios continuam tá?. Já falou do buquê de rosas oferecido? E dos poemas? Olha, o que eu digo tem chegado aí em letras que tropeçam nos dentes pra sair da boca, escorrem por entre os dedos, se embaralham chão afora... O que deu em você, pobre menino? Não sabe traduzir o próprio coração?

Por esses ataques de suor frio, as exaltações, as noites insones reincidentes... ajudaria se você não me culpasse pelas costas.
Tem outra: quem manda aqui sou eu!
Sem mais.


Eu não sabia que faziam tanto barulho, elas - as hemorragias.

"Queria ter coragem de te falar,
mas qual seria o idioma?
Congelado em meu próprio frio,
um pobre coração em chamas"

Matheus - 18/10/10

sábado, 16 de outubro de 2010

Não seria natural.

- Natural é as pessoas se encontrarem e se perderem.
- Natural é encontrar. Natural é perder.

Caio F.

quinta-feira, 7 de outubro de 2010

Conversa

Gosto do silêncio que faz a chuva. Esse som molhado, insistente, finito. Do cheiro também gosto, mesmo não sendo mais o de terra molhada. Pode ser o do gato, do cachorro encharcado desfilando, bobo vadio, nesse chão preto, duro como a vida nas cidades.
Chamo de silêncio o que faz a chuva porque abafa o que há de pior na quietude desses centros: essa camada sonora feita dum ronronar contido, poluído e doente dos motores reclamões que correm lá embaixo para todas as direções e vindos de todos os lados. Do cheiro dessa rosnação toda então, nem falo. Falo. Cheiro preto, entupido, que me engasga a garganta e dá um nó que às vezes nem identifico. Fico assim sem saber dizer se é saudade da terra molhada na rua lá fora ou um grito seco preso aqui dentro. “Mas gritar assim? Logo você, tão calmo, compenetrado...” “Pois é. Às vezes a gente acaba desabando um pouco. Desabafando, digo.”

“Um minuto! Vou ali na rua beber essa tempestade.” “?!” “Fica mais fácil de engolir o choro.”

Sei lá, eu devo ser meio hippie.

Matheus Marins, 07/10/10

Soneto do Corifeu

São demais os perigos desta vida
Pra quem tem paixão principalmente
Quando uma lua chega de repente
E se deixa no céu, como esquecida

E se ao luar que atua desvairado
Vem se unir uma música qualquer
Aí então é preciso ter cuidado
Porque deve andar perto uma mulher

Deve andar perto uma mulher que é feita
De música, luar e sentimento
E que a vida não quer de tão perfeita

Uma mulher que é como a própria lua:
Tão linda que só espalha sofrimento
Tão cheia de pudor que vive nua

Vinícius

terça-feira, 5 de outubro de 2010

Sinais

Sim, lembrarei de você todas as noites enquanto desmaio a cabeça num preguiçoso travesseiro; nas manhãs, antes de começar meu dia, serás também a primeira pessoa na qual pensarei, -antes mesmo de espantar a preguiça contagiosa- vivendo no clichê do desejo. E se a lembrança do pulso me bater na veia, este tenderá a acelerar, levando o que me faz pensar tanto em ti a gritar mais alto pelo que te traz. Pelo barulho, a recordação viria mais forte e neste crescente chegaria a me espancar o peito. Um movimento já se confundindo com o seguinte e quando o músculo já estivesse vibrando, esquecido de pulsar de tão apressado, eu deixaria de reconhecer essas batidas e começaria meu dia.

Tentaria ioga, esvaziaria a cabeça mas o coraçãoaindacheio não sossegaria. Esvaziaria garrafas enchendo cinzeiros sem nunca encontrar o tal amor tranquiloequilibrado, procurado ardente no meio de uma gota ou pingando latejante de qualquer brasa.

Entre brasas e cinzas, sequer conseguiria findar nossa história, tamanhas opções de caminhos para tropeçar... tamanho conteúdo para traduzir e expor nas letras desse moleque aprendiz,.

Matheus, 05/10/10

segunda-feira, 4 de outubro de 2010

Neste modelo político, os governantes do país são um mero (às vezes grosseiro) reflexo de seu povo. Se elegemos jogadores de futebol e comediantes simplesmente por serem populares, não podemos esperar seriedade, pois não podemos nos considerar sérios enquanto “povo”.

Você aí que votou no Tiririca é um(a) menino(a) bobo(a) sem graça e eu gosto tão pouco de você...

Fujo do tema novo do blog e tudo o mais, mas deu vontade de dizer. Logo paro de falar de política.


Matheus Marins, 04/10/10

sexta-feira, 1 de outubro de 2010

O Dia Seguinte

Chamo-me Dilma Rousseff e acaba de sair o resultado da eleição. O salão principal está repleto de paletós e falsos risos vadios. A imprensa se retirou e a festa começa quando o primeiro terno vai pelos ares. Vejo então um companheiro, aliado dos últimos tempos. Aliado político, digo. “É tudo nosso!”, gritam. E tem início uma chuva de roupas. Reconheço um a um os alicerces da campanha. Agora todos mais à vontade, desnudos, crus, desvencilhados de etiqueta, bárbaros, selvagens, desumanos humanos. Corro ao espelho e, por há muito ter aprendido a me ver na terceira pessoa, flagro tudo dobrado, sem saber o que percebia. A roupa sob medida, o broche de ouro no lugar do coração ou o laquê me endurecendo o cabelo, os gestos, os sentimentos e a vida? Havia pupilas dilatadas e a cara cheia de pó branco. “Puta vadia! vem cá!” Lavo o rosto. “Ele é meu parceiro.” Tudo desce pelo ralo. “A gente facilita umas pra vocês.” Incontrolável. “Cadê o pó?” Vozes se misturando. Agora já está feito e não se volta atrás. Descendo pelas escadas da mansão, há whisky, vodka importada, cocaína, whisky, conhaque, erva jamaicana. Vodka importada para boa relação com o exterior. Mais um pouco de pé dos vizinhos colombianos & mercado interno, pra valorizar o produto. E tudo vai se repetindo assim, agressivamente. Subitamente reconheço: há um ponto vermelho que vai se inflando e inflando e se aproxima. Ninguém reparou, mas agora parece um balão a ponto de estourar. Avisto o número 13 pintado na lateral e penso: cuidar da inflação, PIB, alianças etc e tal. Ou não. Nada aqui terá seus moldes arrumados por minhas mãos. Os trabalhadores de poder real estão em volta. Apenas manter a aparência, penso. Um pouco de pé deve ajudar, mas não existe maquiador aqui agora. Apenas tudo exposto. Exposto até por demais. Ministros desaparecendo em viciantes desertos brancos, jovens mulheres abraçadas a peças influentes do partido, depois montando, dançando, se despindo sobre eles. Armaram a festa na mansão. Os rivais políticos não poderiam aparecer. Hoje, nem amanhã e nem depois. O que foi que eu fiz? Tudo ficou assim abatido com toda a confusão do período eleitoral. E eu, que tanto corri, deixei para trás algo de tanta importância neste último passo. Como voltaria a minha vida ao lado do meu companheiro, se é preciso manter tanta aparência perante esse grande balão vermelho? Não se pode voltar atrás, recusar a verba da companhia. Por outro lado, como seguir adiante num caminho tão embolado para não se fazer entendido? Dúvida existencial da primeira presidente do país. Sei que sempre estarei pensando nele. Nas viagens, congressos, entrevistas, discursos, por trás da imagem de pedra feita estátua, lembrarei invariavelmente do meu fiel, primeiro e único grande amor, José Serra.

Vai, desce a página.












































Matheus Marins Alvares 17/9/10

segunda-feira, 27 de setembro de 2010

Esquizofrenia Eleitoral

Na Carioca, desviando de placas numeradas que ostentam risos iguais, propostas de sonhos, números 13 134 4321 tantos, cabelo aparentemente duro, cabeça sem cabelo, barba por fazer, olhos cansados... E foi num desses risos que tropecei e me vi caindo sem graça, atônito, perdido em cima dos dentes brancos e da expressão maquiada querendo confiança. Eu entornando no largo pra dentro do riso impassível, progressista, maquinado, organizado. Fui ao chão. Levantei descomposto e o riso parecia agora se rindo de mim. Ajeitei-me e segui de fininho, sem dar muita confiança, que é pra ninguém ficar mais achando tanta graça na minha cara. Despistando os sorrisos sequentes, ciente de que essa fase logo passa.

Não! Isso não aconteceu comigo!

Matheus 27/09/10

quinta-feira, 23 de setembro de 2010

Queria escrever muito agora. Passaria a tarde inteira cortando palavras, lendo, costurando verbos, descobrindo sentidos, numa primavera confundida com outono, com as palavras caindo no papel feito folhas de uma amendoeira desvairada na calçada. Não posso. Estou atrasado e a rotina às vezes cai mal.
Como o alerta da minha mãe, que grita "Filho, uma e quinze, hein."
"Tá."

Talvez dentro do ônibus eu consiga fazer o mesmo. Terei lá uma hora, sem essa privacidade, claro, sem esse silêncio reflexivo, mas certamente com um excesso de tudo o mais, jogado janela adentro em cada esquina virada à direita, à esquerda, num caminho tão passado que já tem a minha cara. Ou sou eu quem tem a cara tão batida de tanto passar por esses cantos?

Seja como for, "Que seja doce."

Matheus 23/09/10

segunda-feira, 20 de setembro de 2010

Tragédia Concretista

O poeta concretista acordou inspirado. Sonhara a noite toda com a namorada. E pensou: lábio, lábia. O lábio em que pensou era o da namorada, a lábia era a própria. Em todo o caso, na pior das hipóteses, já tinha um bom começo de poema. Todavia, cada vez mais obcecado pela lembrança daqueles lábios, achou que podia aproveitar a sua lábia e, provisoriamente desinteressado da poesia pura, resolveu telefonar à criatura amada, na esperança de maiores intimidades e vantagens. Até os poetas concretistas podem ser homens práticos.

Como, porém, transmitir a mensagem amorosa em termos vulgares, de toda a gente, se era um poeta concretista e nisto justamente residia (segundo julgava) todo o seu prestígio aos olhos das moças? Tinha que fazer um poema. A moça chamava-se Ema, era fácil. Discou. Assim que ouviu, do outro lado da linha, o “alô” sonolento do objeto amado, foi logo disparando:

- Ema. Amo. Amas?

- Como? – surpreendeu-se a jovem – Quem fala?

- Falo. Falas. Falemos.

A pequena, julgando-se vítima de um “trote”, ficou por conta e, como era muito bem-educada (essas meninas de hoje!), desligou violentamente, não antes de perpetrar, sem querer, um precioso “hai-kai” concretista:

- Basta, besta!

O poeta ficou fulminado. Não podia, não podia compreender. Sofreu, que também os concretistas sofrem; estava apaixonado, que também os concretista se apaixonam, quando são jovens – e todo poeta concretista é jovem. Não tinha lábia. Não teria os lábios. Por que não viajar para a Líbia? Desaparecer, sumir… Sentia-se profundamente desgraçado, inútil. Um triste. Um traste.

O consolo possível era a poesia. Sentou e escreveu:

“Bela. Bola. Bala.”

O que, traduzindo em vulgar, vem a dar esta banalidade: “A minha bela, não me dá bola. Isto acaba em bala.”

Não acabou, naturalmente. Tomou uma bebedeira e tratou de arranjar outra namorada, a quem dedicou um soneto parnasiano. Foi a conta. Casaram-se e são muito falazes… oh! Perdão: felizes.


Luís Martins

quarta-feira, 15 de setembro de 2010

- Você tem um cigarro?
- Estou tentando parar de fumar.
- Eu também. Mas queria uma coisa nas mãos agora.
- Você tem uma coisa nas mãos agora.
- Eu?
- Eu.

Caio F.

domingo, 12 de setembro de 2010

Parti ao teu encontro

Cinco anos, quem diria? Cinco anos que o seu olhar cruzou com o meu num lugar qualquer. O contato visual durou cerca de cinco minutos. É um minuto para cada ano, cara. Loucura. Tempo demais para se esperar por alguém. Eu fico me dizendo: "É loucura, é loucura." E acaba que me conformo no sonho que finda cada dia "Um dia, um dia". E vou levando essa esperança que se renova e se alimenta de luz fria. Periodicamente nos afastamos, é claro. Mas suas mensagens voltam a chegar. Volto a corresponder, voltamos a não oferecer resistência e meu castelo volta a afundar na areia doce das promessas de conto de fadas.
Por tudo isso tomei a atitude. Deixei os projetos de lado e parti ao teu encontro. Parti arriscando partir o peito já rasgado de tanto desencontro. Você duvidou, hesitou até o dia do meu embarque. Todos os planos estremeceram, ficou insegura e talvez mais que eu. Ensaiava uma desculpa. Verdade, não nos falávamos fazia tempo. Aquele intervalos periódicos pro coração acalmar. Mas não precisava tanto assombro. Arrumei a mala apenas com roupas, um bloco de papel e uma caneta.
Fiquei no mesmo hotel que antes, que visivelmente não fora reformado dentro dos últimos cinco anos, e fui encontrá-la. De primeira mão, não sei o que passou. Acho que, quando parti, deixei no Rio a parte falante e veio só o garoto tímido, ainda que caloroso, gesticulante. A parte interessante mesmo, acho que não trouxe. A não ser que você julgasse interessante tanto rubor... implacável, covarde rubor me colorindo a cara. Você estava tímida, também sem jeito e com uma expressão indecifrável. À nossa maneira, houve diálogo. E foi bem como no meu pesadelo. Como poderia você ter começado um noivado? Até entendo de não querer mais balanço, mas tínhamos tudo tão certo, tão ensaiado, tão aplaudido nos devaneios... pode ver, minhas lágrimas são cúmplice. Oh não! Elas também esqueci no Rio de Janeiro.
Partido, agora volto. Cinco anos e eu escolho o pior dia. Nem a deixei avisar, mas poderia me ter impedido, você sempre dava um jeito. Você sempre me surpreende.
Sei que pedirá perdão pelas coisas que acabou fazendo hoje e que eu, sôfrego, continuarei gostando de você. Da próxima vez te trago um cigarro, que num dos tragos você cospe esse babaca. E também um pouco de lágrima para degelar isso que se fez entre nós. A você, só tenho a oferecer o meu pior: esse músculo todo lascado e que não quebra. Vaso ruim não quebra mesmo, mas também não sustém flor. Mas por esses vasos de sangue, fica exposto à flor da pele o martírio do músculo todo lascado se contorcendo no gelo.
O frio pode até conservá-lo das medidas do tempo, mas o mantém incurável refém daquilo que não se mede.

Matheus Marins - 27/08/10

quinta-feira, 9 de setembro de 2010

Placebo (?)

É, médica, eu sei que a vida não é fácil e que é preciso estudar para aprender direitinho e passar nas provas, depois conseguir um bom trabalho e se dedicar, daí traçar tudo o que se quer e ser um profissional bem posicionado no mercado, com estabilidade e reconhecimento. Aquelas coisas. Sei que se te passarem um beep na madrugada interrompendo nosso sono, ou nossa insônia, você terá de atender porque há vida em risco. Mesmo sacrificando a vida que criamos, pois sua profissão será uma vida à parte. E cada um é tão importante como você ou eu. Sei. Não tenho problemas quanto a isso e reconheço a importância crucial de uma boa medicina sempre disponível à população. Isso é base para a sociedade. E eu aceito tudo isso, sem problema algum.

Então, médica... se eu deixar meu coração com você, cuida como se fosse o daquele paciente que passou por mil testes e doutores, sem que fosse diagnosticada solução pra essa taquicardia? Seja paciente com a disritmia desse músculo que aos pulos vai me saindo pela boca. Cuida, que com o tempo ele volta ao normal. E quando já não houver mais sinal de descompasso, mão suadas, palavras sumidas, eu vou embora como todo o paciente.

Talvez aí você me deseje outra doença pra voltar aos seus cuidados, só pelo costume. Mas, sinceramente, acho que nunca será coisa tão séria que volte a precisar de seus tratos então. A não ser que eu tenha uma recaída. Sei que você será paciente nesse caso.

Olha eu adiantando a coisa toda. Faço mesmo muito disso, de querer profetizar. Mas agora vamos aproveitar, enquanto... BEEP!.

Matheus Marins Alvares - 09/09/2010

domingo, 5 de setembro de 2010

...continuando no mesmo embalo, do oito ele sobe pro nove. Ah, se eu tivesse
essa determinação...



Tenho falado tanto do tempo... deve ser pelo tanto que tenho pelas mãos... tanto que nem sinto escorrer por entre os dedos...
Tenho todo o tempo do mundo. Mas não gosto de vê-lo passar.

Matheus - 5/9/10

sábado, 4 de setembro de 2010

Silêncio na madrugada
Escarcéu nos delírios.


-----ou


Silêncio na madrugada
Só se for lá fora.


-----ou


Silêncio na madrugada
Tic-tac fala mais alto
Continua ali.


Não soube me decidir por um..

Matheus Marins - 03/9/10

terça-feira, 24 de agosto de 2010

Da próxima vez te trago um cigarro, que num dos tragos você cospe esse babaca.
E também um pouco de lágrima para degelar isso que se fez entre nós.

A você só tenho a oferecer o meu pior: esse músculo todo lascado e que não parte.
Vaso ruim não quebra mesmo, mas ninguém quer botar flor.
E, por esses vasos de sangue, fica exposto à flor da pele o martírio do músculo lascado se contorcendo no gelo.
O frio pode até conservá-lo das medidas do tempo,
mas o mantém incurável refém daquilo que não se mede.

Matheus Marins Alvares - 23/8/10

domingo, 15 de agosto de 2010

Um olhar embevecido, um sorriso? Um verso, quem sabe...

"Eu preciso acreditar na comunicação

não há melhor antídoto pra solidão
e é por isso que eu não fico satisfeito
em sentir o que eu sinto, se o que eu sinto fica só no meu peito
por mais que eu seja egoísta
aprendi a dividir as emoções, e os seus efeitos
sei que o mundo é um novelo, uma só corrente
posso vê-lo por seus belos elos transparentes
mudam cores e valores, mas tá tudo junto
por mais que eu saiba, eu ainda pergunto:

Tás a ver? A vida como ela é
Tás a ver? A vida como tem que ser
Tás a ver? A vida como a gente quer
Tás a ver? A vida pra gente viver

"...Já que a vida é feita de pequenos nadas..."

Tás a ver? a linha do horizonte
a levitar, a evitar que o céu se desmonte?
foi seguindo essa linha que notei
que o mar na verdade é uma ponte
atravessei-a e fui a outros litorais
e no começo eu reparei nas diferenças
mas com o tempo eu percebi, e cada vez percebo mais
como as vidas são iguais, muito mais do que se pensa
mudam as caras
mas todas podem ter as mesmas expressões
mudam as línguas, mas todas têm
suas palavras carinhosas e os seus calões
as orações e os deuses também variam
mas o alívio que eles trazem vem do mesmo lugar
mudam os olhos e tudo o que eles olham
mas quando molham, todos olham com o mesmo olhar
seja onde for, uma lágrima de dor
tem apenas um sabor e uma única aparência
a palavra saudade só existe em português
mas nunca faltam nomes se o assunto é ausência
solidão apavora, mas a nova amizade encoraja
e é por isso que a gente viaja
procurando um reencontro, uma descoberta
que compense a nossa mais recente despedida
nosso peito muitas vezes aperta, nossa rota é incerta
mas o que não é incerto na vida?

A vida é feita de pequenos nadas
que a gente saboreia mas não dá valor
um pensamento, uma palavra, uma risada
uma noite enluarada ou um sol a se pôr
um bom dia, um boa tarde, um por favor – simpatia é quase amor –
uma luz acendendo, uma barriga crescendo
uma criança nascendo, obrigado, Senhor
seja lá quem for o Senhor
seja lá quem for a Senhora
a quem quiser me ouvir, e a mim mesmo
preciso dizer tudo o que eu estou dizendo agora
preciso acreditar na comunicação
não há melhor antídoto pra solidão
e é por isso que eu não fico satisfeito
em sentir o que eu sinto, se o que eu sinto fica só no meu peito
por mais que eu seja egoísta
aprendi a dividir minhas derrotas, e minhas conquistas
nada disso me pertence
é tudo temporário no tapete voador do calendário
já que temos forças, pra somar e dividir
enquanto estivermos aqui
se me ouvires cantando, canta comigo
se me vires chorando, sorri."

Versos de Gabriel, o Pensador

quarta-feira, 11 de agosto de 2010

Eu perdi a conta dos dias, acho que por não ter falado com você na maior parte deles. Períodos assim me parecem mesmo perdidos demais para conta. Conto contigo para quando a sua chegar ao fim, ao dez, quando minha alegria começa. Fico pensando, será que chega logo? Ando louco para chegar aí e sentir seu corpo caber entre meus braços, meu olhar caber dentro do seu...
Mas como contar? Primeiro, segundo, terceiro, quarto, copa, sala, lugares onde a procuro quando acordo. Cantos onde a vejo improvável na hora de dormir. Tão natural agir como se tudo já estivesse acontecendo. O sonho se estranha de ser sonho só.
Afinal, o que é uma diferença numérica perante o tamanho do que a gente sente?


Matheus Marins - 10/08/10

sábado, 7 de agosto de 2010

Confuso

- Oi amor, me paga uma bebida?
- Já? Acabo de chegar, agora não. - Além de que, paguei 35 reais por uma ice na outra casa.
- ... Vem sempre aqui?
- Primeira vez.
(silêncio).
- Você é tímido? Tão calado...
- É que foi você quem veio sentar aqui do meu lado, eu não tenho nada a dizer agora.
- Prazer, Monique.
- Rafael.
- Logo Rafael?
- ?
- Nome de um grande amor...
- O maior?
- O último. Aconteceu uma coisa horrível, não gosto nem de lembrar.
- Faz muito tempo?
- Dois dias.
(surpreso)
- ...conta mais...
- Não posso. Vai acabar com a minha noite. Só lembrar, só pensar já fico mal.
- O que aconteceu?
- Acredite, amor. Tem coisa que é melhor não saber.
- ...
- Vou levantar e ficar um pouco ali no bar. Daqui a pouco a gente se fala.
- E essa cicatriz no seu rosto?
(ela levanta, sai da pista).



Imunda
Travessa
Jogada
entre seus caprichos

O que fazes de mim, bandido?
Entregue
Perdida
Nua, fada dos seus sonhos. sa-fada por qualquer real

Meu maior ladrão
me batendo a todo instante
O meu coração.

Matheus Marins 07/8

domingo, 1 de agosto de 2010

100

Estrondo! Na primeira curva ouviu-se o desacordar dum piscar de olhos que durou tempo demais. Ele no chão, vestindo uma camisa branca com marcas que já acusavam certas aventuras da mesma noite; as pálpebras pesadas: lugar comum aos que prolongaram até essa hora da madrugada sua boemia de sexta. Seu companheiro o puxou de volta para o assento, e os poucos passageiros presentes notaram a cena fingindo normalidade. Logo passa, imaginaram. Para compensar o tamanho avantajado que roubava da camisa branca parte do seu lugar no banco, o companheiro cruzou seus braços com os do amigo caído, segurando firme para não acontecer de novo.
Daí prédio, sinal, pálpebra, quebra-mola, olho no celular, prédio, mola, árvore, pálpebra, chão: Estrondo! Como num ciclo de imagens e reações, a camisa branca, marota, querendo brincar, voltou ao chão do ônibus, mas dessa vez pra valer. Já foi de bruços e conquistando seu espaço na poça. O celular, que pendia numa das mãos, imitou o gesto do dono e também ficou jogado, imundo, boêmio, sonhador num chão que de sonhos nada conservava. Uns figurantes vieram levantá-lo e até tentaram sentá-lo num outro banco. O negócio é que algo acima dele, quem sabe a bebida desleal que lhe bateu de mal jeito nos devaneios, e a qual não negara sequer uma gota da cota de embriaguez oferecida. Quiçá o palhaço bêbado carregando-o no colo, brincando de ventríloquo. Ou a ex-camisa-branca, agora preta. Algo acima dele o quis de volta ao banco estreito e trapaceiro, junto de seu companheiro. Ele obedeceu: levantou e voltou como um monge, causando preocupação e apreensão aos outros passageiros. Atirou-se de volta ao seu lugar apoiado em seu companheiro tal e qual criança faz com ursinho de pelúcia na hora de dormir. Havia virado criança mesmo. É pena que a idade chega, o terminal também. Os passageiros se vão e ele logo volta a ser adulto. A camisa preta cobra sua candura de volta, e se algum segundo da viagem, que nem chegou a ser longa for lembrado, agora ele deverá estar procurando por sua moral num pote de iogurte. Ou não.

Matheus Marins - 31/07/2010

domingo, 18 de julho de 2010

Olha Maria / Pedaço de Mim

Olha Maria
Eu bem te queria
Fazer uma presa
Da minha poesia
Mas hoje, Maria
Pra minha surpresa
Pra minha tristeza
Precisas partir

Parte, Maria
Que estás tão bonita
Que estás tão aflita
Pra me abandonar
Sinto, Maria
Que estás de visita
Teu corpo se agita
Querendo dançar

Parte, Maria
Que estás toda nua
Que a lua te chama
Que estás tão mulher
Arde, Maria
Na chama da lua
Maria cigana
Maria maré

Parte cantando
Maria fugindo
Contra a ventania
Brincando, dormindo
Num colo de serra
Num campo vazio
Num leito de rio
Nos braços do mar

Vai, alegria
Que a vida, Maria
Não passa de um dia
Não vou te prender
Corre, Maria
Que a vida não espera
É uma primavera
Não podes perder

Anda, Maria
Pois eu só teria
A minha agonia
Pra te oferecer

----

Oh, pedaço de mim
Oh, metade afastada de mim
Leva o teu olhar
Que a saudade é o pior tormento
É pior do que o esquecimento
É pior do que se entrevar

Oh, pedaço de mim
Oh, metade exilada de mim
Leva os teus sinais
Que a saudade dói como um barco
Que aos poucos descreve um arco
E evita atracar no cais

Oh, pedaço de mim
Oh, metade arrancada de mim
Leva o vulto teu
Que a saudade é o revés de um parto
A saudade é arrumar o quarto
Do filho que já morreu

Oh, pedaço de mim
Oh, metade amputada de mim
Leva o que há de ti
Que a saudade dói latejada
É assim como uma fisgada
No membro que já perdi

Oh, pedaço de mim
Oh, metade adorada de mim
Lava os olhos meus
Que a saudade é o pior castigo
E eu não quero levar comigo
A mortalha do amor
Adeus


Chico Buarque

Muitas vezes estamos apenas contando a mesma história, só que dividida em várias outras.

Dedicatória.

Para inovar é preciso sonhar, acreditar e agir.

Que passado mais um outono de vida,
você possa sentir frio no inverno,
arder na primavera
mas se queimar no verão.

Voltar ao outono
como o mundo que volteias,
sem esquecer de antes pular outro carnaval.

Que passe ainda por tantos ciclos
sem que se olvide da graça do novo.
Que você seja inovadora em sua vida.

(...)

Matheus Marins Alvares

domingo, 11 de julho de 2010

Reencontrar-te depois de tanto tempo me deixa confuso. Saber de tudo o que fomos e pôr em contraponto com o pouco que somos é dar uma catucada atroz na ferida mal cicatrizada.

E juro que, quando a re-vi, de primeira não soube o que fazer, por mais calculado que meu repertório pudesse estar. Você ria um riso tão fácil, tão saudoso, tão cúmplice de nossos sonhos que, quando nos abraçamos, vi aquela ferida se abrir por completo e se alastrar pelo meu corpo todo, deixando evidentes segredos que até eu desconhecia. Toda a minha vontade escondida ficava destrinchada, nua, entregue de bandeja assim no meio do salão: tudo o que vez ou outra me puxava sempre veloz, porém atrasado, de volta para você: toda a paixão ficava exposta e indefesa, do jeito que sempre sonhei.

Quando você disse que trazia cartas minhas consigo, cartas da época de nossos caprichos, já nem era mais tanta curiosidade quanto assombro, mas da mesma forma quis lê-las.
Cada palavra era uma porrada na minha compostura, uma labareda na minha frieza, uma corda bamba no abismo para os meus cuidados. Eu, vítima de minhas próprias palavras, sei que caí, mas não por completo, porque não foi toda a água contida que caiu de meus olhos trépidos naquele instante.

Era inseguro, desejava e, quando não mais aguentei, te roubei um beijo, ou algo que um dia quis ser beijo, calando uma conversa sobre relacionamentos e me vendo ainda mais perdido de tão solto.

Sei que a noite seguiu seu rumo fiel à normalidade porque tomei o ônibus e era eu trazendo seu perfume comigo outra vez, apesar de intervalos a cada vez mais espaçosos a me dividirem desse teu cheiro. Coisa doce que trazia nas mãos que tanto te seguravam entre nossos devaneios, no peito, trazia nos braços que se alegravam de te dar tantos abraços. Coisa doce... doce, doce essa melancoliazinha. Ai ai

Eu estava em paz... quando você chegou.

Matheus Marins Alvares – 10e11/07/10

quinta-feira, 8 de julho de 2010

Felicidade

Ele tinha o cabelo molhado, talvez pela chuva que caíra perto dali cinco minutos antes. Contraditoriamente, andava apressado e sem ir a lugar nenhum. Ia, mas voltava para o mesmo ponto logo em seguida. E na cidade grande seu rosto já era batido, revestido de cotidiano de forma que ninguém atentava às suas andanças vãs.

Ficou claro que esperava por alguém quando um carro encostou e ele foi ao seu encontro. Era ainda possível percebê-lo recebendo uma maleta de couro, que carregou com todo o cuidado quando deu para sair em disparada para um beco de difícil acesso não muito longe dali. Foi onde encontrou outros homens de paletó e gravata, agachados num chão úmido, fazendo círculo e jogando bolinhas de vidro que batiam umas nas outras. “tudo pronto?” pergunta o primeiro. No que o homem do cabelo molhado faz que sim, um deles bate palmas em direção à janela de um prédio vizinho. Quem aparece abrindo a porta dos fundos é uma criança lá com seus oito anos de idade. Todos sobem em silêncio e no terraço já não se perde tempo: a mala é aberta revelando seu conteúdo: uma formosa pipa verde com uma rabiola respeitosa, toda detalhada. O menino explica todo o processo de preparação e a curiosidade desses homens tem cheiro de porões velhos nunca arejados. Depois, de um em um, todos tentam colocar a pipa à liberdade do ar, recebendo dicas do garoto paciente que ainda ouve pérolas como “no meu tempo era mais fácil”, “o vento está ruim” e “amanhã eu trabalho cedo”.

A pipa já voa orgulhosa quando o horário da aula vai acabando. “Isso é para se usar apenas antes do pôr do sol. Pela noite não dá para enxergar direito, e o céu escuro é bom mesmo para ver os desenhos que as estrelas fazem ou procurar onde a lua se esconde em dias de noite fechada. Experimentem apagar a luz.” Sugeriu o pequeno sabido. Ao fim, todos saem leves de volta para suas casas e com um riso fácil, reparam nos pássaros e esquecem a buzina do carro.

Passaram-se duas semanas desde que uma reunião de trabalho foi feita na casa do Carlinhos, logo quando todo o escritório abriu os olhos após o Rafael concluir, entre uma conta e outra, que queria mesmo era ter os fins de semana como os do filho do Carlinhos e que não havia estudado para ter uma vida assim tão corrida. Aí então se percebeu desnecessário o esforço de todos aqueles homens em fazer o mundo girar mais veloz, e deu de aparecer por ali a graça de viver com o tempo. Mas aquelas pessoas não sabiam bem como funcionava essa coisa de se distrair. Foi quando o Carlinhos prestativamente ofereceu seu filho para lecionar aos adultos como esquecer o trabalho oito horas por dia. Aí eram crianças de todas as idades, vestidas de todos os jeitos, a soltar seus devaneios, desatentas ao relógio que agora corria já de outro jeito.

Conseguir ver um mundo tão vil com olhos de criança é um desafio, uma dádiva para poucos.

Matheus – 04 e 05/07/2010

terça-feira, 6 de julho de 2010

Fazes-me falta

Hoje estive com minha velha amiga Rebeca. Há muito não a via e sem querer esbarramos em nosso passado. Sua lembrança, mais que em qualquer outro dia, me veio atroz, terrível por saudade sem cura pelo remédio que está em falta faz tanto tempo. Há seis meses que estás distante... Cheguei em casa ainda composta, mas fui caindo aos pedaços conforme atravessava a sala de estar e via o porta-retratos com duas pessoas sorrindo, fotografia que não sustenta o pesado ambiente da falta. Acelerei pelo corredor sem olhar o seu quadro. Inevitável, o avistei por nuances do costume da mesma forma e a saudade aumentava. Na cozinha, no quarto, banheiros, sala de jantar, havia vestígios de nossas horas vagas em cada piso daquele chão. E é difícil levar assim. Deito-me à cama com um, mas sigo pensando no outro. As tardes não têm mais graça. Continuo trabalhando à noite para me ocupar. Durmo até a hora do almoço e depois não sei o que fazer. Por isso escrevo-lhe tanto. Já experimentei pintar, jogar videogame, fazer caminhada, futebol, ginástica, arrumar um substituto,... nada funcionou. Meu coração é um traidor sacana de escolher logo você e querer andar tão errado, selecionando os que partem, os que enganam, e enganando os que ficam.
Me peguei imaginando como seria se eu fosse para longe de onde fiquei. Acelerando sobre cada metro deste luar refletido nas águas, chegando à ponta do horizonte (onde uma linha faz o encontro entre dois pontos extremos) e verticalizando após ultrapassá-lo. Seria como quebrar esta formalidade e deixar escapar tudo abaixo da linha do horizonte para onde quisesse estar. Ando com raiva de tudo o que me prende, do formal. Não, não estou com abstinência. Tomo meus remédios também. Acho que é só saudade. Paro de braços abertos na beira da cama. Braços que te procuram, por almejarem de volta tudo melhor que antes: nós dois soltos de tudo contemplando todo o resto que se prende.
Assim meu peito seria alegre contigo, numa enchente carnavalizada em cores. Numa hemorradia de emoções lancinantes. Como um teatro sem cortinas, assim seria a minha felicidade. Sem final para o ato, portanto sem aplauso. Finalmente com nada a esconder atrás da cochia, garanto.

Matheus Marins Alvares - junho/2010

sexta-feira, 2 de julho de 2010

Assim meu peito seria alegre contigo.
Numa enchente carnavalizada em cores
numa hemorragia de emoções lancinantes
como um teatro sem cortinas, assim seria minha felicidade
Sem final para o ato, portanto sem aplauso,
finalmente com nada a esconder atrás da cochia.
Garanto.

Matheus Marins Alvares - Junho de 2010

quinta-feira, 1 de julho de 2010

O velho e a Flor; Veja Você; Mais um Adeus


Ouço e nunca canso.

"O amor é uma agonia
Vem de noite, vai de dia
É uma alegria
E de repente
Uma vontade de chorar

Olha, benzinho, cuidado
Com o seu resfriado
Não pegue sereno
Não tome gelado
O gim é um veneno
Cuidado, benzinho
Não beba demais
Se guarde para mim
A ausência é um sofrimento
E se tiver um momento
Me escreva um carinho
E mande o dinheiro
Pro apartamento
Porque o vencimento
Não é como eu:
Não pode esperar"

Vinicius de Moraes e Toquinho

segunda-feira, 28 de junho de 2010

Despedaço

Como faço para você deixar essa ideia de ir embora sem ter nem chegado, de se aproximar mas ficar flutuante entre a superfície e o fundo? Nem na borda e nem entregue. Segura numa sobriedade inentendível, questionando em silêncio a veracidade de meu anseio e me fazendo duvidar de seus desejos em meio a tanto barulho. Eu diria que, se você mergulhar agora mais fundo que se pensava capaz, encontrará lá, derramada no abismo do encontro iminente, a minha alma. Aí então bastará achar a outra parte de mim. Não é você. É o meu corpo, que se perdeu por aí em suas andanças sem encontrar o que queria.

Matheus Marins Alvares – 28/06/10

domingo, 27 de junho de 2010

Um momento

eu não disse que queria estar assim, nem que estaria sendo se fosse um outro dia, mas acaba que o relógio se cansa e pára de tocar o ponteiro, um momentinho, para assistir a esses instantes com calma, sem aquela pressa de levar tudo ao fim. tic...
fazendo-os enternos até o próximo momento. Tac. passou.

Matheus Marins Alvares - 27/06/2010, às 21h59

Tempo, duração, período, decurso, transcurso, prazo, fase, intervalo,...
"Tenho trabalhado tanto, mas penso sempre em você (.). Se não dormisse cedo nem estivesse quase sempre cansado, acho que esses pensamentos quase doeriam e fariam clack! de madrugada e eu me veria catando cacos de vidro entre os lençóis."

Caio Fernando Abreu
"O reconhecimento ao esforço do derrotado é uma aula para a vida, afinal, só os super heróis da ficção vencem todos os dias. Nós, humanos, somos frágeis e reféns dos nossos limites, de vitórias e derrotas. Quando essa fragilidade ganha aplausos ao invés de vaias ou pancadaria, é um passo adiante para a humanidade."
Autor desconhecido

sexta-feira, 25 de junho de 2010

"Se tiver aprendido lições (amor é pedagógico?), até aproveito e não faço tanta besteira. Mas acho que amor não é cursinho pré-vestibular. Ninguém encontra seu nome no listão dos aprovados. A gente só fica assim. Parado olhando a medida do Bonfim no pulso esquerdo, lado do coração e pensando, pois é."

Caio Fernando Abreu na revista Around, por volta de 1985.

domingo, 20 de junho de 2010




Partiu mas esqueceu aqui sua ausência,
empertigada em meus braços desarranjados.
Ausência que só você pode roubar dos meus vícios imateriais,
Premiando-os em troca com vossa materialidade viciante.


Matheus Marins Alvares - 21/06/2010
E eu acabo ficando viciado nesse negócio...

Esses dois...

"Oi, deixe seu recado. Beijo, Amanda."
Assim, da primeira palavra à derradeira, meus versos ensaiados perderam a ordem de saltar da boca para a nossa conversa.
Quiçá eu estivesse surdo e houvesse adivinhado todo o seu repertório com a perícia de um investigador.
Ou talvez ficado cego e, tentando decifrar a cena, nem me desse conta de que você estava ao meu lado, balbuciando nas entrevozes algo que eu lia em braile. Isso não podia ser.
Instigado, fico atento ao estridor do telefone. Era a minha vez de deixar o recado. Apenas disse: "Que difícil, boa viagem."

Matheus Marins Alvares - 20/06/2010

quinta-feira, 10 de junho de 2010

Acontece...


Tempo pro computador se recuperar dessa virose...

Please Wait...

I'll be back.

domingo, 6 de junho de 2010

Três Músicas

A primeira nota vem do piano de Chopin. Naquela sequência embalada, o de camisa verde se desprende do resto e termina de engolir seu doce. Sente um bem-estar danado, a luz no ambiente é opaca, mas ele vê cores mais brilhantes, muito brilhantes. E pensa que Chopin possuía quinze dedos em casa mão. Extasiado, encontra um coelho branco brincando com as cores no meio da sala.

Mal o pianista termina suas notas, entornam na sala acordes de Just Like Heaven. E o de vermelho se destacou e jorrou pela veia um bocado de heroína. Euforia, calor e conforto o fazem mesmo se sentir Just Like Heaven. O mundo pende por um fio no qual ele dança, sapateia, salta e urra aquilo que lhe apraz aos três ventos que saem do ventilador. O que vem depois não importa, pensa.

O que vem depois é a poesia nos versos de Arnaldo Antunes. É quando o cara de azul se solta para embeber mais um pouco de benzina no pano e sorver outro vale milhas e milhas de viagem de três minutos, é para onde? Paris? Acapulco? Novo México? Marte? Lua? Sol? Sala de estar. Está consumado.

Acaba a última música da playlist, fim. E eu, o de branco, lembro-me que sou a soma daqueles três. Não percebi em quantas partes me despedacei e quantas colorações deixaram escapar entre cada viagem. Sei que restou apenas a mistura de três cores primárias no que era tanta, tanta vida que dava inveja ao arco-íris.

E o de verde está paquerando uma pedra de crack. A vida se esvai contraditoriamente. Minha camisa vai ficando lilás.

Matheus Marins Alvares - 06/06/10

sábado, 5 de junho de 2010

Futuro do Presente

Quando se encontraram, todas as palavras já haviam sido ditas.
O olhar dela penetrou nos olhos dele, passeou, escorreu para a boca, a qual mirou enquanto se achegava.
E a distância diminuía fisicamente, porque em pensamento os dois se faziam um só havia tempos.
E ele caminhava firme em sua direção, aflito, sem saber se ria, se corria para ela como fariam nos filmes ou se deixava a lágrima cair do canto do olho.
E ao ficarem tão próximos, a mão dela não tocou primeiro o braço dele, as cinturas não se achegaram antes que o resto e nem foi uma testa que tocou a outra por antecipação. Ambos e todas as partes do corpo de cada um se conectaram de imediato. E ficaram assim grudados, houve como que uma descarga elétrica que acendeu tanto o brilho nos olhos dela que na atmosfera desses dois a sua luz era mais ofuscante que o sol. Entretanto ele não podia deixar de mirar, seus olhos lacrimejavam e os dois não se controlaram: dois lábios se juntaram e os corpos se encaixavam congruentes. O beijo durou não se sabe se uma semana, um dia, uma hora ou um minuto, mas foi tempo o bastante para traduzir toda a espera pelo acontecido.
Ele avançava nela tal qual um bicho faminto devora sua fruta predileta. E ficava tão bêbado de seu perfume, seu toque, sua saliva, que mesmo tendo calculado todos os gestos anteriormente, às vezes ficava sem ação. Errava na conta, perdia a pose e trôpego ia se ajeitando entre os braços da amada. Inflamaram todo o desejo no melhor beijo que cada um pôde dar. Daqueles que ficam reservados desde sempre, mas a gente nem se dá conta e solta assim sem perceber.
E eles patinaram pelas ruas da cidade que tinha toda sua cor naquele casal. Os transeuntes não compreendiam o que se passava, e os dois subiram deslizando pela parede feito loucos, nas escadas de uma casa, um hotel ou um prédio bem alto.
E o quarto ao qual chegaram ficava tonto de tanta graça, se desequilibrava e jogava os dois para um lado e para o outro. Sem cerimônia ou disfarce, os toques eram sutis porém intensos, na cadência incerta de quem andou muito tempo perdido e agora parece se encontrar aos tantos.
E ele vai escrever nela a glória dos dias mais quistos de duas vidas.
Ela, com seu fogo deixará marcada nele a realidade do sonhado encontro das duas vidas.
Numa outra atmosfera descobre-se finalmente que ela é o sol e ele o planetinha girando tonto em sua órbita, se aproximando a cada volta e brincando com o fogo.
E os acontecimentos subsequentes não cabem em palavras para entrar no relato.

Matheus Marins Alvares - 04/06/2010

*Texto em revisão

quinta-feira, 3 de junho de 2010

moça bonita

De quem é essa prosa leve
de quem deseja bom dia
pede boa noite enquanto se despede

quem é essa moça
sorriso bonito
olhos alegres

mora tão longe
tão perto
do meu coração

Matheus Marins - 03/06/2010

terça-feira, 1 de junho de 2010

Dia de fúria



Queria postar todo dia aqui.
Chegar, sentar na frente do computador e puft! Ter uma história na mão.
Esses computadores que eu passo o dia encarando... gostam mesmo é de dificultar.
Moderno é lápis no papel.
Não precisa apertar botão, só se for lapiseira.
Mas aí não tem que esperar sistema carregar, apertar o F1, aguardar, escutá-lo reclamar da memória ram, não precisa ignorar aquela orquestra toda em desacordo...
No máximo trocar o grafite e desentopir o bico.

Grafite vai pra copa?
E a CPU vai pela janela, já já.

Dia de branco amanhã, hora de dormir.
...hoje tô tão antigo...

Matheus Marins - 01/06/2010

Da gaveta

Quando me perguntar qual é o sentido

Direi que todos os sentidos podem fazer algum

Porque quando meus sentidos aceleram, é você

O fim que se quer justificar, é você

E se esse fim for mesmo justo, será você comigo

Pois, justiça seja feita, o sentido pro meu mundo

É girar em sua órbita

Todas essas frases se direcionam a uma pessoa só

A segunda pessoa do singular.

Singular é o que sinto por você, que sei que ninguém mais sente como sinto

Ninguém me vê como te permito me ver

Singelo.

Quem reclamar que não falei amor

Entrou em desconchavo.

Não entendeu a relação

Com determinada cumplicidade

Essa palavra está nas entrelinhas

Está nas linhas de minhas mãos

Não sabe que seria redundância eu conjugar você com amor em mesmo lugar

Já que toda a conjugação do verbo que aqui faço é indireto para você

Perda de sentido é quando te vejo, mas não a ouço

Leio-te, mas não podes me ver

Ou te vejo, ouço, cheiro mas não posso tocar


Será que senti mesmo alguma coisa?



Matheus Marins Alvares - Vá saber de quando!

domingo, 30 de maio de 2010

Justificam os meios

É outono e ela vai andando pelas ruas, dobra, corre para atravessar, sobe o degrau, paga uma revista, tem pressa para um café rapidinho antes do serviço, está atrasada outra vez, mas a chefe hoje ficou de vir mais tarde.

Ele confere que uma neve fina ameaça brotar lá do alto. Vai caminhando lento. Tem uns passos cansados, que mal o querem mudar de lugar. Atravessa com calma, ouve a buzina do carro ecoar. Coloca um pé sobre a calçada, o outro. Se eleva no degrau com cara de todo-dia. Folheia um livrinho, esconde o jornal e sai sem pagar. Vai entrando na cafeteria. Do balcão, procura a melhor opção, opta pelo simples cafezinho que vê uma moça atraente tomando enquanto apressada folheia umas revistas.

Ela termina o café, tem tempo para dar uma varrida na decoração com os olhos desassossegados, vai mirando até travar o olhar num homem bem vestido lendo jornal com cara cotidiana. Liberta os pensamentos presos, levanta e esbarra talvez sem querer nele. E deixa sua chícara cair, e a porcelana vai se espatifar, e vai dar o maior trabalho para a faxineira.

A chícara cai em cima dele, ele se assusta e derrama café na moça chorando em preto e branco nas páginas do periódico. Respinga um pouco mais no jogador de futebol comemorando, e o líquido preto vai descendo até o seu sobretudo, e a chícara termina seu percurso até o solo, e tudo acontece tão rápido, e ele ainda tão lento. Ele, num arroubo, se sacode e sente a arma escorregar. Olha o chão, lá está. Aquela nove milímetros por cima de toda a porcelana espatifada. Ele só pensa em jogar o sobretudo por cima daquela festa e parece um louco se oferecendo para limpar e pedindo para ninguém chegar perto. Cata tudo e faz da vestimenta uma grande bolsa. Por que ele não usou o jornal?

Ela se desculpa, acusa seu jeito sem jeito, implora, é desculpada mil vezes, ri, percebe ele tentando ser natural sem conseguir, pois usa um sobretudo novo para limpar o chão. Desconfia que esteja inseguro pelo fato de ter se sentido atraído, e ele pode ser tímido. O acha gentil e deixa seu número, convidando para sair mais tarde, depois do serviço. E ele precisava mesmo de uma fachada para tanta alegoria disfarçada.

Ele perdoa, ri sem graça, sua frio, perdoa mil vezes, dá um riso amarelo, tenta manter a compostura com os cacos brancos e o volume de ferro pesado dentro daquele embrulo tosco. Se demonstra vulnerável e a verdade é que ela é mais uma a qual deseja mas não consegue tentar nada, transbordado por outros objetivos mais imediatos. Porém percebe utilidade, e sabe que não é só o seu coração traidor que pede atitude.


(...) E uma pessoa é enganada.


Ela vai tentando girar a chave para sair, as duas mãos cobertas de sangue. Não tem muita força, a bolsa é pesada, e a porta está emperrada, o sangue escorre por suas mãos para o metal da chave, goteja no piso e se espalha feito uma louça a se espatifar.

Ele está desnorteado, sangra mais que ela, vai correndo o apartamento a procurar. Cadê? Precisa daquele dinheiro na bolsa para pagar a cirurgia da mãe de seus filhos. Retirar uns três caroços que colocaram tudo de ponta-cabeça.

Matheus Marins Alvares - 30/05/2010

sábado, 29 de maio de 2010

Rockz


Gosto dessa banda.

terça-feira, 25 de maio de 2010

Tentativa de roteiro 1

Ele: - Isso é por causa do Romário, não é?
Ela: - Claro que não! É por você, apenas.
- Queria tanto que você ficasse...
- Paulo, a situação ficou insuportável
- Sei que errei feio, meu bem. Garanto que não acontece de novo. A partir de agora vamos conversar mais, deixar as coisas claras...
(Silêncio)
Ele: Passo até no seu trabalho no horário de almoço.
Ela: Nem pense em voltar no meu trabalho! Todos já estão desconfiados, me olham torto e tudo! (Exaltada)
Ele: -E quem é que se importa? Você já está querendo dar do pé de lá e ir para Nevada de vez mesmo...
- Um dia eu volto, quem sabe. E aí? O pessoal todo vai lembrar que meu marido me traiu com o meu chefe?!
- Não fala assim...
- Por quanto tempo me escondeu isso, homem? Todos os 8 anos que estivemos juntos?
- Sempre tive receio de sua reação. Mas juro, com seu chefe foi a única vez! Fora isso, há anos que não acontecia.
- Sei...
- Verdade! Verdade!
- Você deveria buscar o que te faz feliz.
- É exatamente o que estou fazendo (soluçante).
- Achei que fosse aceitar melhor.
- No início foi mais fácil... Aí pensei nas manhãs sem ter a quem acordar, o telefone sem utilidade, as noites sem você e seu chá de camomila...
- Desapego, Paulo! Quem errou foi você. Vamos dar um tempo e, quem sabe um dia volto e te faço uma visita.
- Quanta frieza...
(O ônibus com direção a Nevada desponta na entrada da rodoviária, ela se apressa).
Ela: -Vê se ao menos me ajuda a levar essas malas.
(O ônibus de viagem estaciona, a porta se abre, passageiros desembarcam e é a vez dela entrar).
Ele: -Me liga quando chegar.
(guardando as malas).
Ele: - Não esqueça o remédio de enjôo.
(primeiro degrau)
Ele: - Deixei uma lembran...
(fecha-se a porta do ônibus, ela nem se despediu. Ele fica só, na rodoviária, assiste o ônibus em retirada e volta para o apartamento).

CENA 2

Uma semana depois, Paulo no apartamento ligando para a mãe dela.

Ele: - Alô? Ângela? Oi! Sou eu, o Paulo; faz uma semana que sua filha foi embora e não consigo qualquer contato, estou preocupado; ocupada?! Não pod...
- Tum, Tum, Tum. (Ângela bateu o telefone).
(Paulo fica preocupado e resolve investigar. Não consegue nada no antigo trabalho dela, que aparenta estar fechando as portas).

CENA 3

Dois meses depois, Paulo encontra uma conta no apartamento que dá para um endereço em Nevada.

Ele: - Deus do céu!
(gagueja qualquer coisa)
Ele: -É minha chance de rever meu amor. Vou pra lá amanhã mesmo! (falando sozinho)
(Paulo vai para a cama e não consegue dormir. Levanta, deixa o apartamento bagunçado e parte para a rodoviária).

CENA 4

Na rodoviária e, depois, dentro do ônibus

(Paulo está com o bilhete e embarca. A viagem é longa: 16 horas)
15 horas depois:
Rádio local: - Seguros e previdência UNILESCO: A sua melhor opção!... (UNILESCO é o nome da empresa onde ela trabalhava).
Ele: - Então era isso?! A empresa toda mudou para Nevada e ela não contou? Deve continuar trabalhando lá...
Um passageiro: - Quero dormir, cale a boca!

CENA 5

Paulo chega, toma um táxi até o endereço indicado na conta e, ao chegar, vê uma grande casa. Aproxima-se, analisa, vê um varal na lateral, onde Poe ver roupas que são dela e Paulo tem certeza de ter acertado seu paradeiro.
Paulo toca a campainha (barulho de duas pessoas dentro da casa, ouve a voz dela).
Ela: - Sua vez de atender, amor!
A outra pessoa: - A essa hora da manhã... (responde uma voz familiar a Paulo).
A porta abre, é Romário, o chefe dela, vestindo pijamas.

Matheus Marins Alvares - 14/05/2010

*Faltou um diálogo do início que perdi. Se alguém achar que fez falta, avise.
**Não reparar na minha habilidade para escolher nomes.