terça-feira, 19 de abril de 2011

Do outro lado do tempo

Um homem e uma mulher que se sorriem e se abraçam sentados num banco olham direto para mim. São simpáticos e definitivamente têm um momento feliz. Atrás deles, há uma criança agachada pegando na terra algo que não sei. Patos e pombos por perto. É um bonito parque no meio da cidade e de uma primavera qualquer.
Olhando essa fotografia parece que tudo foi belo entre nós o tempo todo. Porém não sei precisar a partir de quando, não sei onde a primavera desandou e assim, insensata, à queima roupa, tu me foste um desacato. Se eu soubesse no início - antes de tudo, quando ainda bem jovens - como você me doeria, me dói e ainda doerá em noites como esta, engasgadas de sonhos cortados, perdidos, de feridas clichês jorradas sob o luar. Se apenas suspeitasse, no início, do desacato que tu me serias, mesmo assim teria feito tudo o que fizemos. E sigo fazendo, em solo, agora meio sôfrego para me livrar de correntes de angústia feito um cão que se sufoca na coleira tentando fugir. Tento um tanto, incansável por vezes ou outras, depois me falta o fôlego e me rendo à falta. Falta de alguma droga sua.
E sigo assim: um junkie desesperado sem ter sua dose semanal de heroína. No meu caso, vilã (=P).
A criança na foto, nosso filho Caio, é quem entra no quarto escuro às pressas e ainda com a roupa do trabalho. Me levanta do chão para a cama e serve meus sossegos na forma de comprimidos. Me olha delicado mas precisa sair. Como cresceu rápido.
Aquelas pessoas na foto agora me olham e se riem divertidas, concordando em não serem felizes para sempre, parecendo sem medo deste fim que arrasto agora em compassos incertos. Ah, mas se eu pudesse recomeçar... riria com ainda mais força na fotografia.

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